Com o crescimento das pesquisas na área da Atividade Física, tornou-se necessário acrescentar métodos que pudessem permitir um conhecimento com maior profundidade, para além de se quantificar o que se faz, entender os aspectos culturais e psico-afetivos do ser humano.
Apesar da dificuldade de se dimensionar esses aspectos acima, foi através das Ciências Sociais e Psicologia que cresceu a abordagem do fenômeno do movimento humano.
Estudar o ser humano é complexo, principalmente sua cultura e vida social, então foi a área de Ciências Sociais, no século XIX, que surgiu o questionamento de uma melhor forma de melhorar a abordagem esses estudos. Com isso surgiram duas perspectivas teóricas predominantes, são as positivistas e fenomenológicas, sendo que a primeira busca fatos ou causas dos fenômenos sociais e a segunda examinar o mundo como é experienciado pelos grupos ou indivíduos. Então a segunda (fenomenológica) passa a ser a qualitativa, pois necessita de desenvolvimento de métodos que produzem dados descritivos de como os indivíduos enxergam a realidade.
Com isso entendemos então que a metodologia qualitativa permite uma abordagem onde pode-se entender melhor a dinâmica e a complexidade dos fenômenos sociais, no seu contexto natural, sendo uma alternativa para o distanciamento entre o pesquisador, o local e os pesquisados.
A pesquisa qualitativa tem a subjetividade como um parâmetro, fazendo com que o indivíduo se sinta parte do processo, e não apenas um número, podendo então se expressar da melhor forma que ele entende os acontecimento consigo e a sua volta.
Para iniciar uma pesquisa, o pesquisador precisa primeiramente conhecer o local, ter uma análise crítica da situação, quais são as questões existentes, para depois definir qual o melhor método de trabalho. Podemos entender então, que essa deve ser uma abordagem "freireana", onde todos os aspectos já existentes devem ser levados em conta.
Deve-se usar o pensamento sistêmico, pois esse aborda a realidade, sem dividi-la em pedaços, pois só a racionalidade científica não é suficiente para entender o desenvolvimento humano. Como já dito anteriormente, a subjetividade aqui tem papel central, levando em conta a cultura, arte e religiosidade.
Com isso o pesquisador também passa a entender melhor a realidade, do ponto de vista dos pesquisados, enxergando com olhos de quem vivencia o dia a dia, mas sempre lembrando de não perder o sentido inicial da pesquisa, conduzindo sem intervir no resultado, na direção das respostas necessárias para o estudo.
O pesquisador deve ser criativo na busca dos instrumentos que serão utilizados, combinando técnicas e percebendo os limites do que foi escolhido, podendo também usar métodos quantitativos.
Na área da saúde a visão mais usada é o pensamento cartesiano, mas entendemos que esse não é suficiente para entender os problemas de determinado grupo atendido nas unidades de saúde, pois tem um visão global e generalizada de como deve ser a prevenção de doenças e os cuidados com a saúde, não levando em conta as características da região e os aspectos individuais do cidadão atendido.
Nesse quadro a pesquisa qualitativa vem ajudar a preencher uma lacuna importante, a distância entre o que as instituições governamentais pensam em como melhorar a saúde do indivíduo, e como o indivíduo e sua comunidade pensam. Não é possível que se continue com campanhas nacionais, como receitas de bolo, para todas as regiões de um país tão grande e com características sócio-culturais e econômicas tão diferentes como o Brasil.
Bibliografia: SILVA, S.A.P.S. A pesquisa qualitativa em Educação Física. Revista Paulista de Educação Física, v. 10 (1), 1996. p.87-98. SCHÜTZ,G.R. Et al. Política de periódicos nacionais em Educação Física para estudos de revisão/sistemática Rev Bras Cineantropom Desempenho Hum 2011, 13(4):313-319. http://www.scielo.br/pdf/rbcdh/v13n4/11.pdf
Quando
falamos em pesquisas qualitativas, logo nos remetemos ao método que será
utilizado para realizá-las e esse questionamento deve ser feito previamente,
durante e após o processo de coleta de informações, isso justamente pela
abrangência e complexidade que este tipo de pesquisa aborda.
As
pesquisas qualitativas trabalham inclusive com dados quantitativos, porém,
trazem diversos outros elementos que possam enriquecer as discussões e propor
soluções mais efetivas para a resolução dos problemas apresentados.
Muitas vezes quando olhamos algumas situações,
logo propomos soluções e abordagens que não funcionam, isso porque não olhamos
para a real complexidade da situação, apenas “tiramos uma foto” do que está
sendo apresentado.
Esta
abordagem está errada, pois ela desconsidera a razão de ser, ou ter se tornado
daquela forma, assim sendo, sem saber nada sobre o objeto de pesquisa, não é
possível propor soluções eficazes.
René
Descartes propõe uma visão tecnicista, onde as pessoas são entendidas como
peças que compõe o sistema, assim como um relógio. Porém este modelo de
entendimento desconsiderada elementos fundamentais, como a construção do “ser”,
desfavorecendo o real entendimento da realidade proposta, e seus elementos que
interagem.
Este
cenário se reflete em diversos meios, como é o caso das unidades básicas de
saúde, onde, usualmente, os funcionários tem que exercer um papel de
pesquisadores para propor soluções, alguns destes funcionários adotam a visão
preventiva da saúde pública, isso acarreta uma resolução pouco efetiva para os
problemas apresentados, por não buscar a fundo e individualizando o tratamento
para cada pessoa.
Desta
forma devemos pensar em um trabalho prévio, antes de nos preocuparmos com o
público, devemos entender que quem trabalha para resolver os problemas nas USS
são pessoas que também possuem suas próprias necessidades, sendo assim, a
resolução para o público atendido pelas UBS antecede a proposição de medidas
para com a sociedade, necessitando a formação e capacitação de quem vai
intervir diretamente com a sociedade.
Então
podemos entender que um problema, tem motivos diretos e indiretos, assim sendo
é necessária a pesquisa qualitativa para entender mais a fundo o cenário que
ele está inserido e os motivos de ser.
É
claro que para entendermos melhor estas questões temos que observá-las com um
olhar diferenciado, buscando sempre entender como o sistema funciona, para
fazer isso temos que entender bem as pessoas que fazem parte dele e suas
individualidades (ambientes frequentados, histórico de vida, experiências
prévias, personalidades, etc) isso acaba compondo um cenário geral de como é o
modelo correto de intervenção, tornando possível a melhoria dos sistemas
individualmente e de forma integrada.
O pesquisador deve deter as
ferramentas para coletar as informações relevantes, propondo assim
intervenções, além de ser “sensível” a questões que possam passar despercebidas,
esta “sensibilidade” é adquirida com a experiência e olhar crítico provenientes
do aprendizado.
Concluindo a discussão, as
medidas que são tomadas para a prevenção e promoção em saúde, são proporcionais
às ferramentas que o pesquisador detém e sua capacidade de interagir de forma
crítica e consciente com elas. Então, tentar utilizar o método, porém não ser
capaz de fazer uso de suas potencialidades, pode ser mais ineficaz do que fazer
uso de um que está descontextualizado.
Referências:
CANESQUI, Ana Maria. Os estudos de antropologia da saúde/doença no Brasil
na década de 1990. Departamento
de Medicina Preventiva e Social, Faculdade de Ciências Médicas, Unicamp.
Ciência e saúde coletiva, 8 (1): 109-124, 2003.
SCHMIDTH, Maria Luisa SandovaL; NEVES, Tatiana Freitas Stockler. O
trabalho do agente comunitário de saúde e a política de atenção básica em São
Paulo, Brasil. Cadernos
de Psicologia Social do Trabalho, 2010, vol. 13, n. 2, pp. 225-240.
Promoção
da Saúde e Educação em Saúde na perspectiva freireana
A
promoção da saúde é uma ideia que requer a mobilização de ações articuladas
para levar a pessoa a exercer suas ações com uma autonomia consciente, em
outras palavras com empowerment. A
essa autonomia inclui-se o aspecto físico-motor, mas, principalmente se dá no âmbito
da razão, da capacidade de fazer escolhas conscientes embasada numa visão
crítica do contexto em que se vive e da concepção do direito à ação em busca de
ideais individuais e coletivos. Por isso a autonomia só se desenvolve de maneira
plena se for alicerçada na verdadeira democracia na qual as pessoas atuam juntamente
com os governantes para direcionar as ações necessárias e garantir que seus
direitos sejam assegurados na prática.
Sabe-se que a promoção da saúde é
uma estratégia que tem como objetivo maior levar as pessoas a terem o máximo de
autonomia possível dentro do seu contexto político, econômico e cultural, mas, para
isso é preciso uma orientação planejada e estruturada, ou seja, é preciso uma educação
em Saúde que tenha uma pedagogia norteadora estruturada em ações por parte dos
educadores que ensine o educando a “saber fazer”, “saber pensar” e “saber ser”.
Ou seja, um método de ensinar estruturado não apenas pelo discurso, mas, pela
ação, como disse Paulo Freire.
Paulo
Freire como Educador e Filósofo pensou um modelo de ensino aprendizagem que
enxergava o educando como uma pessoa capaz de construir o seu conhecimento
sobre as coisas com base na problematização do seu contexto social, cultural e
político, Paulo Freire denominou esse método de Educação Dialógica. Logo, o educando,
segundo Paulo Freire, deve chegar às suas próprias conclusões com base em
reflexões pautadas no diálogo, na divergência de opiniões, na liberdade de
expressar o seu sentimento sobre tudo que está relacionado à sua vida. O educador
seria então, uma ferramenta que iria induzir o educando a seguir esse caminho
com plena liberdade de reflexão, é uma proposta de aquisição de conhecimento
dinâmico, autônomo, desenvolvido no processo de fazer, pensar e no exercício da
expressão de ser em meio ao seu contexto. Com base nesse olhar da pedagogia freireana, a humanização e o acolhimento na relação educador – educando se
torna imprescindível, pois, para educar alguém segundo Paulo Freire é
necessário conhecer o contexto e as experiências que a pessoa acumulou durante
a sua vida para utilizá-los como ferramenta e levar a pessoa a refletir sobre
as coisas que estão relacionadas ao seu contexto social para que ela possa
pensar com base na realidade, agir e perceber as suas potencialidades no
ambiente em que vive. Porém, Paulo Freire reconhece não ser fácil aprender a
ser livre para pensar e tomar decisões com autonomia dizendo que “a libertação
é um parto doloroso”. É difícil para o professor permitir que o aluno seja
autônomo, que não precise necessariamente dele para calcar suas reflexões e
ações, assim como é difícil para o aluno se libertar da ideia de que quem tem
determinado conhecimento tem o direito de pensar por si mesmo e quem não tem aprende
com quem sabe achando-se incapaz de produzir conhecimento junto com o educador.
Paulo
Freire deixa muito claro que Educação deve estar intrínseca à reflexão política
referente ao ambiente que si vive para que não seja nula, incapaz de levar o
indivíduo a ação em si.É preciso
então, encorajar a pessoa para uma tomada de decisão a respeito do que ela é contra ou a favor e de quem ela
é contra ou favor. Paulo Freire diz então que é impossível educar sem despertar
a consciência política das pessoas e que é impossível até mesmo pensar em
educação sem que se esteja atento às relações de poder. Ele ainda ressalta que a
educação não nasce do poder, mas, se chega ao poder pela educação.
Portanto,
promover saúde é uma estratégia que só faz sentido se as pessoas forem educadas para que
tenham autonomia e que essa autonomia as levem à atuação no âmbito político encorajadas
por escolhas feitas com base na reflexão sobre o seu contexto social. O Educador
Paulo Freire no seu pensamento sobre como deve ser a educação descreve
perfeitamente esse cenário cujo objetivo nunca deve ser formar um produto final, ou seja, pessoas que reproduzem informações sem refletir sobre elas porque não sabem articular conhecimentos, mas pessoas em processo contínuo de reflexão sendo capazes de fazer escolhas e realizar ações, em suma, pessoas participativas e conscientes do que é melhor para a sociedade e
para si mesmo.
"Quais os meios pelos
quais o educador ensina seus educandos? E qual é a Pedagogia? Paulo
Freire,explica ".
A Educação Dialógica praticada como uma pedagogia para humanização
e com diálogo o educador se aproxima do cotidiano do educando, conhece sua
realidade e sua cultura para respeita-las, não invadindo, mas considerando os conteúdos do
cotidiano na elaboração e na prática das suas estratégias de
ensino-aprendizagem.
Um
elemento que também inspirou essa reflexão em que tentamos minimamente relatar
o nosso entendimento sobre a promoção da saúde e educação em saúde na
perspectiva freireana, além, é claro, das aulas inspiradoras da nossa professora
Marília Velardi, foi a leitura das primeiras páginas do livro “A importância do
ato de ler” escrito por Paulo Freire. Nesse livro ele descreve com minúcia o
seu olhar sobre a relação educador-educando, descrevendo de forma poética a sua
própria infância para mostrar que o caminho que leva a educação dialógica
defendida por ele nasce primeiramente das considerações conscientes sobre o
contexto sociocultural em que o educando se desenvolve. Esta é uma leitura
muito agradável e reflexiva, pois, trata-se de uma visão extremamente
humanizada da relação educando-educador pensada por Paulo Freire.
MIRANDA,
KCL; BARROSO, MGT. A contribuição de Paulo Freire à prática e educação crítica
em enfermagem. Rev Latino-am Enfermagem 2004 julho-agosto; 12(4):631-5
GADOTTI,
MOACIR. Perspectivas atuais da educação. São Paulo em perspectiva, 14(2) 2000
FREIRE,
PAULO. A importância do ato de ler: em três artigos que se complementam. São
Paulo: Autores Associados: Cortez, 1989
Em situações nas quais o conhecimentos que compartilhamos envolve a aprendizagem e a reflexão sobre valores e atitudes é importante que nós estejamos atentamente conscientes do nosso olhar sobre o mundo. É preciso parar e pensar, refletir e fazer escolhas racionais sobre o modo como vemos o mundo em que vivemos. No caso da nossa disciplina a minha sugestão é de que façamos um caderno de campo, no qual as experiências com o cotidiano - assistir a um filme, ler um livro, ir a uma exposição, conversar com as pessoas - nos traga elementos para refletirmos conscientemente sobre os valores que temos, sobre os conceitos que discutimos em aula e sobre qual é o nosso lugar no mundo e especialmente qual lugar queremos ocupar com a nossa profissão.
Um caderno de campo é escrito em primeira pessoa e inicialmente narra a experiência de modo descritivo, atento aos detalhes. No caso de um filme, por exemplo, isso implica em narrar quem eram os atores, diretores, roteiristas; qual o tema, se o roteiro é ou não original, se é uma obra ficcional ou não. Depois, qual é a narrativa e na sequência quais as impressões do autor do caderno, dando atenção especial àquilo que relaciona a experiência cotidiana (assistir ao filme) com aquilo que discutimos em aula.
Esse é um exercício importante, pois ao lidarmos com pessoas e compartilharmos de suas vida é fundamental que nos exercitemos sempre para sermos hoje mais compreensivos, reflexivos e autônomos. do que ontem... mais críticos e conscientes, mais humanos... um exercício pra uma vida inteira, que começa com um primeiro passo. Ou com um primeiro caderno...
Material para o caderno, esse documentário narra as histórias que deram início à trajetória do educador brasileiro Paulo Freire.
Ótima dica do doutorando da Faculdade de Saúde Pública da USP Thiago Herick de Sá divulgada pelo Prof. Dr. Douglas Andrade.
Fiquem de Olho
"Grupo de Trabalho sobre Transporte e Saúde, do Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (FSP-USP).
Gostaria de pedir indicações de alunos de graduação interessados no tema da mobilidade urbana e sua relação com a saúde da população.
O grupo de trabalho tem por objetivo ampliar a investigação sobre o padrão de deslocamentos da população e sua relação com desfechos de saúde, com especial atenção para a prática de deslocamentos a pé e de bicicleta. Seria muito interessante contar com bolsistas de fora da FSP, especialmente da Geografia, Poli, FAU e EACH (GPP). Caso conheçam algum aluno com este perfil e interesse, por favor, peçam-no para entrar em contato pelos emails thiagoherickdesa@gmail.com / thiagodesa@usp.br ou no telefone 963441480. O edital será aberto em breve."
No campo da saúde uma série de eventos
que acontecem estão relacionados ao comportamento das pessoas e, neste sentido, o pensamento que norteia essa questão facilmente pode ser dirigido a uma lógica simples: se os problemas de saúde estão
relacionados ao comportamento das pessoas, então a solução para esses problemas está
na mudança de comportamento.
Especialmente após a Segunda revolução epidemiológica muitas medidas
começaram a ser tomadas para direcionar a mudança de comportamento das pessoas, muitas vezes a qualquer custo,
impondo as ações que deveriam ser adotadas pelo indivíduo para prevenir
doenças, sem que houvesse estreita preocupação com as características pessoais e culturais, com os gostos, desejos e vontades e com o sentido do "novo" comportamento para o
indivíduo, portanto, sem levar em consideração que as pessoas têm autonomia.
A promoção da saúde, assumindo uma perspectiva de
humanização, defende que o serviço de saúde deve ser reorientado para que
“seja sensível e respeite as necessidades dos indivíduos”, ou seja, leve as
pessoas a pensar sobre o que fazem, sem imposições, mas estimulando a autonomia, pois todos nós temos autonomia, autonomia é uma
condição humana!!!!!
Autonomia
Autonomia e “empowerment” estãodentre os conceitos mais utilizados quando se fala em Promoção da Saúde, e estão intimamente relacionados - um torna-se meio para o outro.
A autonomia é uma condição humana que
está relacionada com conhecimento, pensamento crítico, consciência. Com o saber argumentar e
sustentar uma convicção, uma opinião e nos traz uma ideia de liberdade, inclusive para lidar com a nossa saúde. Nesse sentido, a autonomia seria “ampliação do controle ou domínio
dos indivíduos e comunidades sobre os determinantes de sua saúde” (Teixeira et al., 2008).
A ideia de autonomia (auto = próprio, nomos= norma, regra, lei) conduz o pensamento imediatamente à ideia de liberdade
e de capacidade de exercício ativo de si, da livre decisão dos indivíduos sobre
suas próprias ações e às possibilidades e capacidades para construírem sua
trajetória na vida (Teixeira,
et al 2008).
Para alcançar uma autonomia é necessário que haja uma rede de apoio para o desenvolvimento humano que compreenda, além das questões básicas de vida e sobrevivência, o acesso a cultura, a produção
humana, o conhecimento. O desenvolvimento humano, por sua vez, não se dá sem
saúde e o contrário também é verdadeiro, pois sabemos que as condições sociais
e econômicas dos indivíduos influenciam em seu estado de saúde e no que
entendem por saúde.
Para entender melhor sobre a autonomia como condição humana, uma dica
de leitura: FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 25 ed.
São Paulo. Paz e Terra, 2011.
O “Empowerment”
O termo “empowerment” é analisado por Carvalho (2004) classificando-o em duas vertentes: o psicológico, um lado que aponta mais para a ideia de individualidade, passando uma visão de que cada pessoa é
capaz de escolher o seu destino, ao mesmo tempo em que possibilita uma
compreensão de culpabilização das vítimas pelos seus problemas de saúde, quando há a "não escolha" de algo que lhe fora informado como método para prevenção
de determinada doença (sem levar em consideração o porquê daquela “escolha”). A segunda vertente apontada pelo autor é o “empowerment” comunitário, que está estritamente relacionado àquilo que é preconizado pelo pensamento de Promoção da
Saúde,. Nessa perspectiva o “empowerment” tem
relação direta com uma autonomia comunitária, com capacidade de os sujeitos de uma
determinada sociedade reconhecerem seus próprios direitos,
conseguirem ter o conhecimento das ações que podem tomar para obterem
benefícios direcionados diretamente a eles como um grupo, não apenas como
indivíduos separadamente. É o pensar não somente em si, como também no outro e
num bem comum a todos.
Em aula levantamos até o
questionamento de que autonomia e “empowerment”
estão associados também com a consciência de não estar sozinho no mundo, pensar também nas
outras pessoas, na comunidade e até mesmo saber pensar inclusive para tomar a decisão de não
fazer algo pensando no bem de todos e abrindo mão de uma coisa que faria bem
apenas para o próprio indivíduo.
Quando o “empowerment” psicológicoé exclusiva meta a ser atingida, torna-se permissível que outras formas de poderes se aproveitem para justificar ações como a privatização da saúde, ou ações individuais
nas quais apenas a maioria que tem acesso a produção humana de conhecimento
tenha condições para ter autonomia de escolha de hábitos saudáveis que a levem
a prevenção de doença. Este tipo de uso deve ser considerado equivocado.
O “empowerment”
psicológico pode ser analisado no âmbito da sensação de autoconfiança do
sujeito que irá levá-lo a posterior atividade em grupo, mas não se deve tratar
o conceito focando apenas no individual. O sentido coletivo deve também fazer parte do
conceito e, por isso, a definição de “empowerment”
comunitário torna-se mais adequada na utilização para Promoção da Saúde,
por ter relação direta com a autonomia coletiva, na qual o poder é
distribuído de forma igualitária na sociedade, caracterizando os âmbitos
subjetivos, sociais e pessoais ao mesmo tempo em articulação com os determinantes sociais e ambientais (Carvalho, 2004).
É importante ressaltar também que quando
falamos em autonomia e “empowerment”,
ambos estão interligados e dependentes de fatores como a liberdade de se
expressar e indagar contra ou a favor de algo, o conhecimento para argumentar
sobre circunstâncias, e também da educação fornecida pela vida ou que também
pode ser classificada como a educação moral, na qual os valores de uma
sociedade são intrínsecos no conceito deste termo.
Percebemos
diante de tudo isso que para ser autônomo consigo e com a comunidade é
necessário uma educação para a autonomia. Nesse sentido há os Grupos de
Promoção da Saúde (GPS) que são “uma integração coletiva e interdisciplinar de
saúde, constituído por um processo grupal dos seus participantes até o limite
ético de eliminação das diferenças desnecessárias e evitáveis entre grupos
humanos” (Santos et al., 2006).
Considerações finais
Na nossa sociedade nós ainda não temos a construção da autonomia consolidada como meta. A educação em valores, a educação voltada para a vida, não é tarefa consciente da escola, e, aos poucos, essa ausência nos leva para o contexto dos atuais problemas de padrões de comportamentos.
Em sala foi discutido a questão de que é difícil ensinar uma criança a cuidar de si e da sua saúde quando seus pais não têm meios para educarem integralmente e criticamente os seus filhos.
Em sala apontou-se que uma das
possíveis soluções dos problemas comportamentais seria as escolas educarem as
crianças desde cedo para saberem como escolher a melhor maneira de agir por meio do desenvolvimento da consciência crítica, o que deve ser conquistado com acompanhamento e apoio. É necessário também ações que levem em
consideração toda a sociedade e seus valores para que todos possam exercer sua
autonomia e “empowerment” pensando no
bem comum.
No entanto autonomia e empowerment não são uma questão de tudo ou nada, nem são metas atingidas em tempos curtos. Tomando uma situação citada em aula sobre a pressão que os adolescentes sofrem de um lado para o início da vida sexual e do outro pela responsabilidade pelo uso de medidas de prevenção de DSTs e de gravidez indesejada será fácil decidir não transar com um parceiro desejado caso ele não queira transar sem camisinha? Como dizer isso ao seu
parceiro? Como agir em caso de discordância? Mais do que saber o que é certo é preciso ter maturidade suficiente, autoestima elevada e autoconceito positivo para sustentar sua opinião e seus
valores diante de uma situação que envolve emoções, paixões e outras sensações
do momento. É... nada simples! O discutido em sala foi que as chances de o adolescente ceder seriam grandes,
e nesse sentido entramos em uma questão de que ter autonomia é um processo
adquirido ao longo da vida e que, em certas fases da vida ainda estamos construindo
nossa autonomia e também por vezes ao longo de toda nossa vida teremos momento
em que poderemos ser mais autônomos e noutros não.
“Por outro lado
ninguém amadurece de repente, aos vinte e cinco anos. A gente vai amadurecendo
todo dia, ou não. A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si é vir a
ser.”Paulo Freire
Em suma, os conceitos de autonomia e
“empowerment” nos ajudam a entender o sentido das estratégias de Promoção da Saúde, como se estes conceitos fossem mediar nossa visão para a compreensão
melhor do que vem a ser promoção de saúde, para nósfuturos profissionais da atividade física,
que vamos lidar com pessoas, com o cuidado com o outro, pela promoção da saúde
por meio da atividade física. Por isso, entender esses conceito torna-se fundamental para nossa prática
profissional, nos norteando em como desenvolver a autonomia em nossos alunos,
de maneira que eles saibam o que fazer, como fazer, porque fazer e possa fazer a
melhor escolha do que mais faz sentido em sua vida e o deixa mais feliz.
Para visualizarmos a complexidade do empowerment coletivo, uma dica é o filme Milk, dirigido
por Gus Van Sant. Milk é
um filmeestadunidense
de 2008 baseado na vida do político e ativista
gay Harvey Milk, que foi o primeiro homossexual
declarado a ser eleito para um cargo público na Califórnia, como membro da Câmara de
Supervisores de São Francisco.
Prá finalizar, a música Autonomia (e Cartola) com Sacudindo o Choro e Fernanda Brito E
se pudéssemos exercer nossa autonomia? O que você acha?
“Ai! se eu tivesse autonomia
Se eu pudesse gritaria
Não vou, não quero...”
Referências
CARVALHO,S.R.
Osmúltiplos sentidos da categoria
"empowerment" no projeto de Promoção à Saúde Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro, 20(4):1088-1095, jul-ago, 2004. FLEURY-TEIXEIRA,P. ET AL. Autonomia como categoria central no conceito de promoção de saúde. Ciênc. saúde coletiva vol.13 suppl.2 Rio de Janeiro, Dec. 2008. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232008000900016&script=sci_arttext
SANTOS, L.M; DA ROS, M.A.; CREPALDI, M.A.; RAMOS,L.R. Grupos de promoção à saúde no desenvolvimento da autonomia, condições
de vida e saúde. Rev Saúde Pública 2006;40(2):346-52
Esse vídeo expressa a discussão feita em sala sobre autonomia. Nessa esquete, a pessoa teria a oportunidade de ESCOLHER o que quer comer e COMO quer comer. Partindo do princípio que esta rede de restaurantes é bem conhecida justamente por isso, ou seja, o indivíduo paga uma valor para escolher O QUE quer e COMO quer. Mas, observem o vídeo e comentem se ela teve realmente autonomia. Analisem todos os detalhes, as expressões faciais do atendente e da cliente, o tom de voz de ambos, as tensões musculares e corporais, o cenário ... Assistam até o fim pois existe uma perspectiva de uma terceira pessoa que de alguma maneira também se envolve com o ocorrido e qual seria sua autonomia?